"Sempre tenho confiança de que não serei maltratado na porta do céu, e mesmo que São Pedro tenha ordem para não me deixar entrar, ele ficará indeciso quando eu lhe disser em voz baixa:"Eu sou lá de Cachoeiro..."

(Rubem Braga)

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Isto aqui ô ô (também) é um pouquinho de Brasil iá iá


E pensando bem, muitas dessas coisas que julgo serem simples de resolver, não são. Frutos de ingenuidade, as soluções que costumo encontrar para resolver problemas, aparentemente simples, in verdade, são ineficazes, ou melhor, impraticáveis. Não as vejo sendo executadas, portanto, resta-me crer que só podem ser “sonholuções”!

Acabei por concluir, de maneira forçada, que a sociedade politicamente e sócio-ambientalmente correta é utópica, coisa que seria vista apenas em filmes de Steven Spielberg... Ingenuidade, sem dúvidas!

Durante a semana acompanhei o caso do lixo hospitalar que tem sido utilizado na indústria têxtil brasileira... Vamos pensar um pouco sobre isso: Estados Unidos e Portugal não tinham para onde enviar seus restos hospitalares e aí surgiu a grande ideia! Por que não enviar para o Brasil?! Preço acessível, colaboradores tupis inteiramente à disposição e pronto! Lixo pra cá, porque aqui, com o famoso jeitinho brasileiro, lençol contaminado vira “bermuda de praia”... Verão está chegando, não é?!

Historicamente o desdém dos EUA pelo mundo poderia explicar esse mal entendido aqui no Brasil, esse mal entendido de achar que aqui é uma espécie de “lixão mundial”. Para os portugueses, talvez, tenha sobrado resquício de quando o Brasilzinho era colônia. É pode ser... Mas o que explica, ou como se explica que nós, brasileiros, atentemos contra nosso patrimônio permitindo este tipo de prática? Em solo brasileiro “parece” ser comum confeccionar roupas com retalhos, sobras de lençóis hospitalares nunca utilizados... Bolso com a inscrição Barra D’Or, São Lucas... Será? Volto ao pensamento ingênuo, porque a esta altura é só o que me resta.

Em 2009 a “finíssima majestade européia” teve problemas para descartar seu lixo, então empacotou tudo e mandou para o “plebeu Brasil”. E na época escrevi a respeito: Só esqueceram de avisar que aqui não há lixeiras para abrigar toneladas de entulho alheio e que, o Brasil não está interessado nas dores de cabeça da nobreza... Aproveitei aquele ensejo para tratar sobre reciclagem e, atualmente, pensando na barbárie do lixo hospitalar estrangeiro, penso que é necessário esclarecer: RECICLAR NÃO SIGNIFICA TRANSFORMAR LENÇOL ENSANGÜENTADO EM ROUPA!

Brasil, meu Brasil brasileiro da “Aquarela” de João Gilberto, Brasil que canta e é feliz. Diga-me: “Isto aqui, o que é?” Caetano Veloso?

Utopia, sonho... Ingenuidade... Não importa. Lá vou eu: É preciso fiscalizar constantemente, atentar para abusividades do tipo e impedir que reincidam. Fiscalização portuária rígida quanto à “pacotes” vindos de outros países sob encomenda ou sob pressão. Isto aqui é um pouquinho de Brasil iá iá e não a casa da mãe Joana, onde se faz o que bem entende! Cidadãos, integrantes desta sociedade, nós temos voz ativa e imperativa sobre questões que versam sobre o bem comum. Isto aqui é nosso! Bastam de omissões, acomodações e egoísmos. “[...] é muito difícil você vencer a injustiça secular, que dilacera o Brasil em dois países distintos: o país dos privilegiados e o país dos despossuídos”. (Ariano Suassuna). Mas não é impossível; não enquanto houver disposição e esperança.

(Valquiria Rigon Volpato - Advogada, Articulista e principalmente, cidadã!)

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Patrimônio Público


Nunca será excessivo falar sobre o Itabira, ainda mais se as questões a serem abordadas forem, como são, pertinentes, atuais e de domínio público (ou ao menos deveriam ser). Na última sexta-feira, 07, o Conselho Municipal do Monumento Natural do Itabira se reuniu para, finalmente, aprovar seu regimento interno e por assim dizer, dar o “pontapé inicial” nas realizações práticas e efetivas do conselho a respeito do Monumento Natural.

A criação de conselhos para gerir áreas importantes no município torna-se, cada vez mais, registro da Administração Casteglione. A delegação de poder aos conselhos permite que haja maior participação na tomada de decisões, fazendo com que, teoricamente, comandos despóticos inexistam. Sobre a questão Itabira, mais especificamente, não tenho medo de tornar-me repetitiva, pois é tema que vale (e muito) a pena.

A cadeia de montanhas que compõe o quadro Itabira é referência para Cachoeiro de Itapemirim e isso significa dizer que, o privilégio de estar sob o “olhar atento das montanhas” não é exclusivo de quem reside na região próxima ao Itabira, mas é, de fato, agraciamento a todos os cachoeirenses, tornando-a assim patrimônio público. E aquilo que é de todos, sabe-se, primariamente, que deve ser zelado por todos.

A realidade da região do Itabira sofreu abruptas mudanças em pouco tempo, especialmente no que se refere à redução da área de “preservação” (digamos assim, grosseiramente). Alguns “investimentos” no local, por exemplo, não condizem com as características e tão pouco se amoldam àquele meio; foram responsáveis por abrir uma ferida na paisagem. Muito se diz sobre investir, ampliar e gerar renda, mas em casos como o do Itabira (que mereceu até conselho próprio) deve-se avaliar, cuidadosamente, que tipo de investimento fazer.

A área, que é tão próxima ao centro da cidade, não pode tornar-se uma extensão deste. O Itabira possui identidade e personalidade que não podem, de maneira alguma, serem usurpadas. Para os que defendem a expansão comercial, vale dizer que, em momento algum há repulsa quanto a novos investimentos na localidade. Existe, tão somente, a preocupação de que tais investimentos sejam absorvidos pelo meio a tal ponto de confundirem-se com ele. As incompatibilidades não podem vingar, porque estariam perseguindo a mesma linha de raciocínio que transformou, desconfigurou e desmatou quilômetros de mata virgem em busca 
do “crescimento”, conforme se banalizou em nossa história.

Há tempos convoco a população para abraçar a causa Itabira, reconhecendo que nela há interesse público. Assim como há (ou deveria) interesse público em outras questões tão pertinentes que acabam sendo deixadas à margem de nosso poder fiscalizador-zelador. Nos atuais dias, não nos basta sermos povo, devemos participar! E só tem direito de exigir, aquele que se sente no dever de fazer parte. Portanto, ainda que repetidamente, abandonemos nossa zona de conforto e passemos a ser escoteiros de uma nova sociedade: SEMPRE ALERTAS!

(Valquiria Rigon Volpato - Advogada)

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Por acaso


A vida deveria ter mais daqueles acasos não premeditados, não estabelecidos, não agendados. Acaso é acaso e pronto! Simplesmente acontece, sem previsões, sem acordos... São, por natureza, os planos mais bem sucedidos!

O homem é do tipo que quer estabelecer e possui forte tendência a padronizar o dia-a-dia: acorda, pula da cama (quase sempre atrasado), vai ao banheiro, se veste, toma café (quando dá tempo), chega ao trabalho, se cansa, reclama, torce pelo final do expediente (até que ele efetivamente chega), sai do trabalho, encara o trânsito, volta para casa, liga a TV, come e... Dorme! No dia seguinte repete-se a rotina e a rotina de segunda a sexta interrompe-se no sábado, para que a rotina do final de semana tenha, também, a sua vez.

E quantas coisas se repetem uma, duas, três, quatro, cinco, infinitas vezes e nós, acostumados ao “repeteco”, pouco nos importamos? Ou talvez sintamos vontade, necessidade de mudar, mas os (maus?) hábitos são tão fortes que acabam por nos incapacitar, criando barreiras aparentemente intransponíveis; as mesmas barreiras que nos impedem de viver o acaso.
Se eu pudesse viveria de acasos! Essa mesma espécie de ocasião imprevista produtora de fatos que dá significado ao “Epitáfio” melodioso dos Titãs: “O acaso vai me proteger enquanto eu andar distraído”.

A não necessidade de se estabelecer regras é que faz do acaso algo muito bom. Quando não se planeja, quando simplesmente acontece, dá-se a surpresa e certamente ocorrerão grandes chances de ser inesquecível. As melhores saídas, os melhores encontros, os melhores sorrisos, os grandes amores... Frutos do inesperado, do imprevisível que torna a vida mais leve e “desfrutável”.

Não, não é de se pregar uma vida sem limites, com fronteiras inatingíveis; é de se pregar a auto-permissão, o direito individual e intransferível de ser autêntico, aleatório e responsável, muitíssimo responsável por si e pelo outro, de modo que a liberdade de um não interfira na liberdade do outro.

Numa sexta-feira, após o expediente, se você decidir parar num bar com um amigo e, enquanto conversam, observa que na mesa ao lado há alguém que, sozinho, dedilha um violão. Você canta, silenciosamente, as músicas que o “cara da mesa ao lado” toca, você gostaria de juntar-se a ele... Neste mesmo contexto, a grande diferença entre “observar e sorrir”, está na conjunção que será empregada na frase: Usando uma conjunção adversativa, quase sempre exemplificada pelo “mas”, você continuará sendo um observador.  Já usando uma conjunção aditiva, quase sempre expressa pelo “e”, você será alguém que passará ótimos momentos sorrindo e cantando (ainda que não seja afinado, que não saiba o ritmo da canção, que pouco entenda de música), porque foi justamente no “E”, que você mostrou-se suficientemente capaz de permitir que o acaso fizesse parte de sua vida! O acaso é aquele de repente que quase sempre termina em sorrisos.

(Valquiria Rigon Volpato - Advogada)