"Sempre tenho confiança de que não serei maltratado na porta do céu, e mesmo que São Pedro tenha ordem para não me deixar entrar, ele ficará indeciso quando eu lhe disser em voz baixa:"Eu sou lá de Cachoeiro..."

(Rubem Braga)

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Eu?... quem sabe?

...acho que posso me definir sim, talvez não tão bem, porque ainda sou um EU em construção. Sou do tipo que gosta de sorrir e fazer sorrir (não, eu não sei contar piadas engraçadas, não seria uma boa comediante, mas ainda assim, tento provocar o riso). Houve um tempo em que era adepta às lágrimas, porém, aos poucos, resolvi que elas deveriam ser substituídas. Não mais as provoco e a todo instante mantenho-me firme para que os outros não as provoquem em mim. Se um dia desses elas reaparecerem, quero que sejam de alegria; quero lágrimas misturadas ao riso... 

Acredito que a vida pode ser mais, que não viemos a este mundo a passeio e que cada um tem uma missão importante para cumprir. Aos poucos estou buscando descobrir a minha. Quero deixar meu nome escrito, não em um busto numa praça, mas nos corações e na lembrança daqueles para quem eu fizer o bem. Se um dia quiserem me render homenagem, que seja feita através das boas recordações e que isso emocione, mas que não provoque tristeza, porque é com felicidade que quero ser lembrada...

Sinto-me simples, sinto que posso ser como as flores do campo, singelas e ao mesmo tempo belas, não por sua exuberância, mas por sua delicadeza. Espero, um dia, ser tão livre como um pássaro na mata, voar livremente no céu azul, enxergar do alto o colorido da natureza... viver do suficiente para saciar a fome e ser grande o bastante em consciência e caráter para compreender que o tudo se aproxima do nada e o melhor mesmo é repartir...

(Valquiria Rigon Volpato)

É preciso "corar" de vez em quando...


A grande maioria de meus artigos nasceu de conversas, observações durante o caminhar pelas calçadas cachoeirenses. Aprecio a arte de observar e traçar, imaginariamente, qual seria a situação desenhada naquele cenário mudo captado por meus olhos. Quando devidamente entrelaçadas, as palavras facilmente me emocionam e isso pode até ser que demonstre fragilidade, mas prefiro encarar como sensibilidade, talvez não a mesma captada por aquela “antena delicadíssima” que Newton Braga possuía, no entanto não menos valiosa.

Admiro a sabedoria popular, admiro a sabedoria científica, admiro o saber, especialmente quando quem o transmite tem o dom de fazê-lo. Felizmente nossa capital secreta nos reserva momentos ímpares, oportunidades que São Paulo, por exemplo, não nos daria ou não nos permitiria. Cachoeiro nos faz sermos mais próximos, nos garante o encontro casual, que está marcado naquele mesmo local de sempre, onde não se agendam reservas, mas que, inevitavelmente, se tem cadeira cativa!

Numa dessas “oportunidades casuais” de conversa, aprendi um pouco mais sobre a importância de enrubescer. Falávamos sobre atos da vida pública, tema propício em ano eleitoral, mas que calhou muito bem para outras situações do cotidiano. É que a vida talha os indivíduos, os molda, e nem sempre ela, a vida, da fôrma e formas corretas a todos. Existem momentos em que não se pode deixar transparecer o interior; o que se espera de nós, ao menos enquanto indivíduos “públicos”, de convívio em sociedade, é pulso firme, decisões. O caso é que neste grande baile social em que vivemos, quem não souber dançar ou pelo menos fingir que sabe, ficará à margem. Máscaras e máscaras... Vivemos com elas e não é apenas no Carnaval!

A importância de corar as faces nos remete à imediata reflexão que, de vez em quando, é preciso abandonar os disfarces e sermos apenas nós. A couraça que o dia a dia nos obrigada a possuir tende a nos deformar, mas ainda que deformados não podemos jamais nos esquecer de quem somos e, principalmente, a que viemos.

Somos enxadristas por nascença. Vivemos de traçar percursos e estratégias para, ora nos defendermos, ora atacarmos. Não chega a ser “maldade”. É imposição. Criamo-nos assim, pois acreditamos que somente assim escaparemos com vida de nossas próprias vidas. Não discordo, mas mantenho-me atenta, porque sei que é preciso jogar, mas sei também de quem sou e minha essência não é feita desse “jogador plantão”. Tanto não é que, não tão esporadicamente, ruborizo.

(Valquiria Rigon Volpato - Advogada)

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Que será de mim?


Que será de mim, pássaro que quer voar sem asas? Imensidão de céu azul, algumas nuvens e aquela sensação de liberdade... Que liberdade? É que fico assim, que sou assim, uma captura da matéria, um peso, um preso, um corpo; é que sou assim, pensamento, mente em devaneio, soltura. Sou contradição entre aquilo que me prende e o que me liberta. E sofro. E quero. E insisto. E persisto. E fraquejo. E desisto. E morro em mim... Sofrimento besta, pequeno demais para o tamanho dessas minhas asas atrofiadas. Mas o que dizer e o que fazer? Ter asas e não saber (poder) voar? Desperdício é ter e não ter. Que infortúnio! Respiro fundo, preencho os pulmões, prendo aquele ar e tento embriagar-me dele, sei que em breve também irei perdê-lo, assim como todo o resto. Perdi. Não me recordo de ter ganhado alguma vez. O que tenho é aquilo que fui encontrando pelo caminho; coisas que outros não quiseram; partes, restos. Colhi o lixo deixado às margens da vida e pensei que, com jeitinho, poderia reciclá-lo e fazê-lo meu, finalmente algo meu, mas que triste ilusão... Que bobo esse pássaro deficiente! Das sobras as sobras, nada de nada, um pouco de tudo e no fim aquela criação disforme, torta, feiosa. Cadê aquilo que deveria ser meu? É isso? É só isso? Tão pouco... Sei que me impus limites muito próximos e que foi por medo de arriscar que nunca soube se um dia poderia ganhar. Na verdade, havia aquela esperança, bobinha, inocente, mas tão e tão medrosa que de tudo se escondia. Não era preciso um baile à fantasia para usar máscaras, pois fazia questão de sempre usá-las. Não sabia mais o que era face e o que era disfarce, talvez até achasse que o falso era o verdadeiro... Força do hábito, aquele hábito ruim de me fazer menor, assim como os vãos da janela, aquelas grades que recortam a noite e emolduram luzes distantes, fazendo também daquilo uma espécie de quadro, pequenos quadros que pendurei junto às lembranças que ainda restam. Fosse há outros tempos as telas me fariam companhia; tintas e cores, pincéis e novas cenas. Pronto! Vida nova em dois tempos! Aquele frescor me faz falta e por vezes desejei tanto e tanto tê-lo de volta que lá, bem longe, cheguei a crer que o tinha reencontrado. Bobagem. Passou. Óleo sobre tela, luzes pela janela; um quadro. Nem era real. Perdi a seqüência dos atos e minha peça deixou de fazer sentido. Vi que um a um meus espectadores se levantavam, saíam e meu teatro ficou vazio. Não havia mais ninguém para assistir à minha composição. Vida! Assim chamava-se minha peça, escrita, estrelada e assistida por mim... Isso porque decidi que deveria ficar. Afinal de contas, como seria minha Vida sem mim?

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Caso de Polícia


RESPEITO. HONESTIDADE. QUALIDADE. São estas as palavras inscritas em quadros com flores e paisagens na suja parede do DPJ de Cachoeiro de Itapemirim.

O artigo deste domingo, assim como tantos outros já escritos, tem o escopo de ressaltar situações que devem ser mudadas, transformadas, para que o básico, o mínimo, o constitucional seja garantido à população e isso indistintamente; o artigo deste domingo expressa minha particular revolta quanto à falta de estrutura física, de pessoal e salarial a que está submetida nossa (in) segurança.

Na sexta-feira, 10, caminhando por uma das ruas do bairro Independência às 14h, fui surpreendida por indivíduo que “nojentamente” tentou lançar mão sobre mim (e uso este termo no intuito de abrandar a narrativa dos fatos, em respeito a você, leitor). Assustada com o ocorrido, gritei, qualifiquei o sujeito com palavrões até bastante suaves se comparados ao que ele merecia. Ainda trêmula decidi que deveria fazer registro do ocorrido, então me dirigi ao DPJ de Cachoeiro de Itapemirim, noticiei o fato aos presentes e fui orientada a aguardar. Meu tempo de espera: aproximadamente 03 horas. Tive sorte. Neste ponto este artigo poderia ser dedicado por inteiro a reclamar por questão de mau atendimento ou coisa do tipo, mas não, não foi isso o que ocorreu. O atendimento que tive foi excelente, porém excelente dentro das possibilidades mínimas de que dispõem policiais e funcionários.

O local de trabalho dos “digitadores”, meninos que colhem e registram a narrativa das vítimas é insalubre, inóspito. Paredes imundas e apenas um ventilador para combater a alta temperatura que assola a cidade, como bem conhecemos. A suposta sala de espera se resume a cadeiras. Num ambiente sujo, precariamente refrigerado, com insuficiência de maquinário, de tinta e papel para impressora, além de insuficiente mão-de-obra, admirou-me (e muito) o bom humor de quem lá trabalha. Em 03 horas de espera esforcei-me para captar todas as informações (e reclamações) possíveis. Escutei absurdos. Abusos. Salários mal pagos e pagos com atraso. Sistemas falidos, caros e inconsistentes, irreais. Causou-me asco.

Policiais há anos sem promoção de cargo, servidores mal remunerados (nem todos, é verdade) que suportam seu dia-a-dia apenas por razão de se ter mínima estabilidade, que pensam em aposentadoria. Numa organização em que os profissionais não são reconhecidos e sequer estruturados com o mínimo que lhes permita bem trabalhar, o que se pode esperar? Segurança? Ou seria QUALIDADE, conforme mencionado no quadro pendurado na parede do DPJ?

Se a Administração Pública não consegue manter funcionando o tripé saúde-educação-segurança, o que devemos esperar para o futuro? Talvez se cumpra a fictícia profecia do fim do mundo... Será que caminhamos para um Brasil anárquico (no sentido pejorativo da palavra)? Providências. Providências é o que se deve exigir. Este artigo poderia desqualificar a polícia, maldizer atendimento, mas escolhi observar esta história pelo lado de quem a vive internamente e lhes digo, com toda certeza, há heróis trabalhando por nós.
Encerro lembrando Cazuza, que assim como muitos, também se indigna com esse Brasil: “Não me convidaram pra esta festa pobre que os homens armaram pra me convencer, a pagar sem ver, toda essa droga que já vem malhada antes de eu nascer... Brasil! Mostra tua cara quero ver quem paga pra gente ficar assim. Brasil! Qual é o teu negócio? O nome do teu sócio? Confia em mim...”. E me permita confiar em você também...

(Valquiria Rigon Volpato - Advogada e cidadã indignada...)