"Sempre tenho confiança de que não serei maltratado na porta do céu, e mesmo que São Pedro tenha ordem para não me deixar entrar, ele ficará indeciso quando eu lhe disser em voz baixa:"Eu sou lá de Cachoeiro..."

(Rubem Braga)

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Análise, conveniência ou desinformação?


Anualmente, quando vejo a avaliação do Poder Legislativo cachoeirense no jornal fico decepcionada, porque, de forma lamentável, tornar-se perceptível a intenção “vexatória” que o plano de fundo da matéria traz consigo.

Concordo que é preciso fazer mais, fazer melhor, elevar o nível dos debates, atentar-se ao rigoroso cumprimento das leis, fiscalizar atos do Poder Executivo, estar presente nas comunidades, NÃO como muitas vezes a população deseja - um Legislativo travestido de Executivo -, mas presença instrutora, que consiga desmistificar esse esteriótipo “desgraçado” de que vereador deve pavimentar ruas, colocar lâmpadas, patrolar estradas, construir muros, pontes, pagar contas, doar material de construção, comprar botijas de gás, limpar ruas, colocar placas, dar dinheiro para comprar o que quer que seja... Essas não, definitivamente, não são funções do Poder Legislativo. A “praga” instalada nesse conceito está no dito (sábio) da cultura empírica: “o uso do cachimbo põe a boca torta”.

Num passado, lamentavelmente, não tão remoto, e por culpa dos homens do Legislativo, a prática dos FAVORES foi associada com intimidade à capacidade de conquista de votos. Assim, parcela robusta da população acredita que para bem exercer a vereança o representante deve praticar favores como se sua função fosse, tornando cada vez mais difícil o entendimento de que os “homens da lei” devem propor ações que não extrapolem sua competência, competência essa prevista, mormente, na Constituição da República.

As cobranças populares estão com desvio de direção. Cobrar e exigir regularidade não deve ser optativo e sim obrigatório ao cidadão, no entanto não se pode lançar exigências de forma incorreta. Como exigir da vaca que produza refrigerante, se sua função natural é produzir leite? Não podemos culpar a vaca por não fornecer aquilo que não pode! Seguindo ainda no exemplo, mais prudente seria então propor parceria à vaca, de modo que com sua influência no mercado leiteiro, ajudasse a reforçar o brado por refrigerante junto àqueles que o fabricam... O Poder Legislativo pode engrossar as vozes que clamam por melhorias, pode salientar o debate de modo que o Poder Executivo, caso não esteja agindo como deveria, retome seus caminhos.

O cenário político atual não está convidativo ao olhar mais brando, menos acusador e mais observador, de fato; a presunção não é de inocência, muito pelo contrário, embora somente acusar não resolva os problemas – que são muitos. Em meio a lama dos mais tenebrosos pântanos, emerge, quase que imperceptível, a flor de lotus, assim como em meio a tanta desordem e corrupção há aqueles que querem fazer algo para mudar, que ainda trazem no coração a esperança de melhoria e exaurem suas forças em prol do bem comum. Talvez seja este o olhar necessário ao momento: o de quem não mede esforços e dá o melhor de sí para tornar menos árduo o caminhar de todos.

Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário formam a tríade de regência social, podem ser amigos, desde que se respeitem e não queiram desempenhar um a função do outro. Quando, por qualquer questão, resolvem praticar atos que são da competência do outro, literalmente, metem os pés pelas mãos e ao invés de ajudar, acabam atrapalhando e causando mais prejuízos do que benefícios.

Particularmente, a Câmara Municipal não deveria estar preocupada em fabricar leis, como foi o mote da matéria realizada, mas sim em buscar a execução de tantas leis que após sua entrada para o mundo jurídico estão à míngua, sem efetividade. O jornal, por sua vez, deveria ir além do “basicão” e apresentar ao público as incontáveis indicações para execução de serviços, os diversos ofícios encaminhados aos órgãos e repartições púbicas solicitando desde informações à regularização da prestação de serviços, as inúmeras reuniões para estudos de projetos de lei – que devem ser de iniciativa do Poder Executivo, mas que o Poder Legislativo abraça como se seus fossem, tão somente para que o trabalho conjunto resulte no melhor para a comunidade. Em que momento a matéria mencionou o CÓDIGO DE POSTURAS, objeto de estudos, audiências públicas e intermináveis debates? Onde está a menção acerca do trabalho das comissões permanentes da casa? A Comissão de Constituição, Justiça e Redação, por exemplo, reúne-se semanalmente, mais do que uma vez por semana, analisa projetos do Legislativo e do Executivo, preocupando-se com detalhes, travando, por vezes, batalhas de opiniões técnicas tão somente para alcançar o melhor para todos e não deixar fugir à legalidade e à justiça -.

Um povo que se cala ante às mazelas políticas se torna permissivo, contudo, um povo que brada demais aos quatro cantos apenas por bradar, sem direcionamento, é como “cão que ladra, mas não morde”; chama atenção, porém não intimida. Repetição de palavras não é opinião, ao contrário do que muitos pensam e como muitos têm feito. As melhores críticas são aquelas capazes de identificar o problema, fazê-lo ser compreendido e apontar possíveis soluções – não as que queremos, mas as que, de fato, cabem.

http://g1.globo.com/espirito-santo/estv-2edicao/videos/t/edicoes/v/populacao-avalia-o-trabalho-de-vereadores-de-cachoeiro-de-itapemirim-es/4370052/