Nunca me pareceu vício

O cigarro era um amigo. Entre os dedos da mão direita, levando-o à boca com precisão cirúrgica, tragava e, então, jogava fora a fumaça branca. Repetia o gesto incontáveis vezes durante o dia. Entre um cigarro e outro, cumprimentava, com poucos movimentos, quem por ele passava. Seu ponto favorito? Entre duas paredes de um muro velho, decoradas com pichações maliciosas. Aparentava cansaço. Não! Desânimo. Rabugice. Das poucas vezes que passei por ele, desviei o olhar, não queria o encontro, não me sentia confortável, embora, passos mais tarde, curvasse a cabeça de modo a vê-lo, pela última vez, antes de curvar a esquina. Quarta-feira, dia gris, uma fina camada de poeira d'água caía do céu. Da janela reparei a fumaça branca, virei cautelosamente o olhar… Ele. Senti um arrepio mais frio do que o ar daquele dia percorrendo a espinha, engoli saliva, gosto amargo. Estendi a mão e apanhei o copo com água, um gole após o outro, fazia força para engolir o nó na garganta e dissolver ...