Postagens

Mostrando postagens de 2021

"Esse não é um texto sobre saudade, é sobre ser e estar presente..."

Imagem
...ela costuma ficar por ali, no quintal de casa, estendendo roupas no varal, dando milho às galinhas, molhando as verduras na horta ou só sentada mesmo na escada – nos dois primeiros degraus, pertinho do terreiro – descansando ou chupando uma laranja. De casa é perto, vou até ela uma ou duas vezes durante o dia, normalmente, pra gente papear, falar da vida cotidiana na roça, dos sonhos – meus e dela, claro – planejar viagens, falar das paquerinhas; ela me ouve com atenção, não importa se está lavando a louça ou fazendo pão, ela não perde o foco. É rápido: café tá pronto, cheiroso, o “pão de casa” quentinho e a manteiga fica toda derretida. Se o papo estava bom antes, agora é que não tem fim! Quando o relógio aponta as três da tarde, ela liga o rádio na Diocesana pra ouvir a oração, depois abaixa o volume pra não atrapalhar a conversa e a gente continua. Quando chega visita – eu acho que a visita chega naquela hora, porque sabe que tem pão quente e café fresquinho – ela logo convida pr...

O sertão que há em nós

Imagem
"Em beiras de ruas de chão batido, enfileirados desenham escadas humanas, pequenas vidas severinas de severidades que se aproximam, vão no vão de seus anseios desejar o mínimo – arroz, feijão – a fome, se vai embora, deixa solidão; ela é constante companhia. Dói o estômago vazio, dói mais o pouco raciocínio de quem, tendo a chance, não resolve problemas, apenas fomenta a confusão."   Aridez de sentimentos em terra rachada de corações-torrões, sangra os calcanhares dos pés cansados, desses andarilhos, tantas vezes, desanimados em busca de sua própria redenção. Ouvi dizer que têm sede de justiça, cuja fonte anda seca; de cuias nas mãos, imploram: dignidade! Gritam no deserto – não têm eco, não têm representatividade. Em beiras de ruas de chão batido, enfileirados desenham escadas humanas, pequenas vidas severinas de severidades que se aproximam, vão no vão de seus anseios desejar o mínimo – arroz, feijão – a fome, se vai embora, deixa solidão; ela é constante companhia. Dói o e...

ODE À CULTURA POPULAR

Imagem
“...quando a batida no couro do tambor respondeu à primeira estrofe da cantoria, veio vindo, de dentro, a vibração; sangue pulsando e a certeza de que havia ali identidade. Era o mesmo DNA. Batendo palmas, a roda se mantinha, calor provocado pela emoção aquecendo a noite fria daquele 13 de Maio” .   Brasil, país de tantos tons, nasceu miscigenado, injetou nas veias de seus filhos a diversidade e acertou na composição. Vovó Aparecida contava que quando foi encontrada estava debaixo de uma sombrinha, num pasto de fazenda, rodeada pelo gado, disse que o capataz pegou a cesta e levou-a para a sede da fazenda, pra ser criada. Vovó era preta. Já o vovô Antônio, de olho claro, veio marcado pela longa travessia do Atlântico – navio que deixaria a Itália para ancorar no Brasil. Vovô era branco. Num país de misturas, somos resultados de um todo que se explica, mas nem sempre se entende; caminhos atravessados pelo amor, mas também pela dor. Em 1888, naquele 13 de Maio, a notícia era de que ...