Sepulcros caiados


"Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que sois semelhantes aos sepulcros caiados, que por fora realmente parecem formosos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda a imundícia." (Mt. 23, 27)


É preciso que haja indignação. Lamentável como uns e outros não reagem quando se deparam com mentiras e falsidades. Impossível não se sentir enojado com as tramas e tramoias que acabam por enredar o indivíduo e fazê-lo viver um “faz de contas” especialmente preparado, arranjado nos mínimos detalhes, com finalidades escusas e deslindes devastadores.

As relações humanas têm perdido o visgo que certa vez as promoveu, que as mantinha não como as conhecemos atualmente, mas como no tempo em que ainda eram dotadas de respeito, ainda que minimamente. Perdeu-se o respeito. É trágico. Não se pode olhar cenário tão catastrófico sem que haja um abalo emocional interno, estopim de revolta e asco. Não se pode entender como normal, aceitável, tantas traições descaradas e não sentir pavor, pânico, diferente do medo, contudo associado à repulsa; não se trata simplesmente de sentir calafrios, mas sim de se criar espécie de bloqueio contra o agente propagador da enganação. Extirpar do convívio sócio-habitual aquele que dissemina a daninha praga aniquiladora do crescimento é questão, literamente, de honra.

Quando, ao observar vastas plantações, nota-se a presença incontrolável de pestes, há que se atentar para o meio, identificar condições que possam estar facilitando a proliferação dos invasores. Fatores climáticos, má adubação do solo, ausentes práticas de controle, enfim, parasitas aproximam-se do que os dá condição de sustento, pois sua ação, silenciosa e ao mesmo tempo devastadora, está pautada no quanto podem sugar de suas vítimas, deixando-as enfraquecidas ou até que morram. No campo, a sorte da lavoura está no fator de identificação e início imediato do combate às pragas. Na vida, a sorte do ser humano está, também, na identificação e extermínio daquilo (ou daqueles) que o tentam aniquilar.

Perceber quando o mal está próximo, não permitir que se instale ou, caso instalado, afastá-lo o quanto antes, é a melhor garantia de não sofrer com as consequencias do aproveitamento nocivo praticado pelo agente danoso. É preciso afinar os sentidos, não se deixar levar por achismos, aparências...

A bela e frondosa goiaba, no mais alto galho da goiabeira, desperta desejo, no entanto ao tê-la nas mãos, ao mordê-la com todo afã, enorme é a decepção ao perceber que a belíssima fruta está podre por dentro, invadida por larvas, danificada; era casca. Aparência. E só. A ilusão do belo vive de momentos, não é sólida e constante o suficiente para se sustentar, não é perene, pois o que alimenta (corpo e alma) está por dentro, escondido sob o aspecto exterior, aspecto esse que também irá se deteriorar... Mais ou menos dia a mesma goiaba “exibida” estará reunida às outras tantas que, como ela, certa vez despencaram do galho e agora apodrecem no chão.

Vidas embasadas em mentiras são porosas, rapidamente se esfacelam. Não há máscara que se sustente com o passar do tempo, porque ninguém consegue ser intérprete de sí mesmo por longas datas. Cada ser humano é recheado de questões, “imperfeições”, conflitos e demandas internas; uns resolvem seus problemas, outros omitem sua existência e daí vem a farsa, início do teatro. As primeiras cenas são atrativas e até prendem a atenção do público, porém a extensa e exaustiva sequência de atos se torna desgastante e enfadonha. A plateia passa a não ter mais o mesmo interesse, arranja conversas paralelas, desvia a atenção e, ao final, sequer sabem do que se tratava a peça ou quem, de fato, eram os atores envolvidos. Uma vida teatral e chata.

Mentiras não ficam escondidas por muito tempo, disfarces são disfarces, não são reais. É como dizem: “quem é de verdade sabe quem é de mentira”. Repudiar o falso é instintivo, mas se não o for, deve se tornar atitude. Quem permanece apático ante as enganações acaba por as merecer. A verdade é bandeira dos justos, dos que possuem caráter... Aos pobres de espírito nem mesmo as mais belas peças, tecidas em fios de ouro, cairiam bem; seriam sempre trapos vestindo corpos sem alma...

Valquiria Rigon Volpato
13 de outubro de 2015

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