"Sempre tenho confiança de que não serei maltratado na porta do céu, e mesmo que São Pedro tenha ordem para não me deixar entrar, ele ficará indeciso quando eu lhe disser em voz baixa:"Eu sou lá de Cachoeiro..."

(Rubem Braga)

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Por acaso


A vida deveria ter mais daqueles acasos não premeditados, não estabelecidos, não agendados. Acaso é acaso e pronto! Simplesmente acontece, sem previsões, sem acordos... São, por natureza, os planos mais bem sucedidos!

O homem é do tipo que quer estabelecer e possui forte tendência a padronizar o dia-a-dia: acorda, pula da cama (quase sempre atrasado), vai ao banheiro, se veste, toma café (quando dá tempo), chega ao trabalho, se cansa, reclama, torce pelo final do expediente (até que ele efetivamente chega), sai do trabalho, encara o trânsito, volta para casa, liga a TV, come e... Dorme! No dia seguinte repete-se a rotina e a rotina de segunda a sexta interrompe-se no sábado, para que a rotina do final de semana tenha, também, a sua vez.

E quantas coisas se repetem uma, duas, três, quatro, cinco, infinitas vezes e nós, acostumados ao “repeteco”, pouco nos importamos? Ou talvez sintamos vontade, necessidade de mudar, mas os (maus?) hábitos são tão fortes que acabam por nos incapacitar, criando barreiras aparentemente intransponíveis; as mesmas barreiras que nos impedem de viver o acaso.
Se eu pudesse viveria de acasos! Essa mesma espécie de ocasião imprevista produtora de fatos que dá significado ao “Epitáfio” melodioso dos Titãs: “O acaso vai me proteger enquanto eu andar distraído”.

A não necessidade de se estabelecer regras é que faz do acaso algo muito bom. Quando não se planeja, quando simplesmente acontece, dá-se a surpresa e certamente ocorrerão grandes chances de ser inesquecível. As melhores saídas, os melhores encontros, os melhores sorrisos, os grandes amores... Frutos do inesperado, do imprevisível que torna a vida mais leve e “desfrutável”.

Não, não é de se pregar uma vida sem limites, com fronteiras inatingíveis; é de se pregar a auto-permissão, o direito individual e intransferível de ser autêntico, aleatório e responsável, muitíssimo responsável por si e pelo outro, de modo que a liberdade de um não interfira na liberdade do outro.

Numa sexta-feira, após o expediente, se você decidir parar num bar com um amigo e, enquanto conversam, observa que na mesa ao lado há alguém que, sozinho, dedilha um violão. Você canta, silenciosamente, as músicas que o “cara da mesa ao lado” toca, você gostaria de juntar-se a ele... Neste mesmo contexto, a grande diferença entre “observar e sorrir”, está na conjunção que será empregada na frase: Usando uma conjunção adversativa, quase sempre exemplificada pelo “mas”, você continuará sendo um observador.  Já usando uma conjunção aditiva, quase sempre expressa pelo “e”, você será alguém que passará ótimos momentos sorrindo e cantando (ainda que não seja afinado, que não saiba o ritmo da canção, que pouco entenda de música), porque foi justamente no “E”, que você mostrou-se suficientemente capaz de permitir que o acaso fizesse parte de sua vida! O acaso é aquele de repente que quase sempre termina em sorrisos.

(Valquiria Rigon Volpato - Advogada)

2 comentários:

  1. E, você sabe, o acaso protege quem anda distraído.

    Wunderbarer Text! =D

    ResponderExcluir
  2. E, você sabe, o acaso nem sempre está de acordo com o que você espera pra sua vida.

    ResponderExcluir